quarta-feira, 2 de abril de 2008


A escada de livros
A menina estava sentada num jardim, um jardim bonito mas rodeado de uma alta muralha. Estava só, a menina. Como tinha ela chegado a este jardim, quem tomava conta dela ou quem lhe dava de comer? Não me perguntem, porque não sei. Só posso dizer que estava ali e se sentia muito só.
“Em algum lugar deve haver uma porta na muralha” – pensou. Lentamente, caminhou ao longo do muro a apalpar as pedras, mas não encontrou nenhuma brecha ou abertura. Bateu na parede, mas o som era igual em todo o lado.
Sentou-se então debaixo de uma grande árvore, no meio do jardim. E ouviu, lá no alto, um chilrear de pássaros.
De repente, apareceu um livro ao lado da menina. Ela abriu-o e viu um A maiúsculo e, à direita, a imagem de uma ave, a de uma abelha e a de uma aranha. Na página seguinte, havia um B junto a uma bola, um bebé e um berlinde.
Quando a menina já tinha aprendido todas as letras, chegou um segundo livro flutuando no ar e pousou junto dela; depois um terceiro, um quarto e um quinto... A menina pôs-se a folheá-los. Cada livro fazia um barulho diferente.
Em seguida cheirou-os e cada um tinha um odor próprio. Ao princípio, a menina só lia as letras, mas depois as letras transformaram-se em palavras, as palavras em frases e, por fim, em histórias. A menina não parava de ler. Montou elefantes e camelos, embarcou numa canoa e até deslizou a toda a velocidade sobre o gelo num trenó puxado por cães. Sentou-se no trono dourado de um palácio e instalou-se na colorida manta de uma tenda de índios. Mas, nos livros, ela encontrou sobretudo outras crianças – crianças divertidas ou tristes, tímidas ou atrevidas, sossegadas ou travessas. Quando a menina dormia, sonhava com outros meninos. Quando lia, estava com eles. Quando porém estendia a mão para tocar algum menino, tornava a ficar só, e sentia-se triste.
De repente teve uma ideia. Pegou os livros e com eles fez uma escada muito alta, até conseguir subir por ela e olhar por sobre a muralha.
Do outro lado, descobriu um jardim e nesse jardim estava sentado outro menino.
“Eh! Estás a ouvir?”, Chamou ela.
Ansioso, o pequeno desconhecido ergueu os olhos e estendeu os braços.
Então, a menina desceu ao seu jardim, juntou uma pilha de livros e subiu outra vez até ao alto da muralha. O rapazinho tinha escondido a cara entre as mãos e estava a chorar.
“Aí vão!”, gritou a menina deixando cair um livro após outro. Devagar, como as folhas de uma árvore, os livros caíram na relva. Sete vezes foi a menina buscar mais, até o menino conseguir fazer com eles uma escada do outro lado da muralha. Em seguida, passo a passo, o rapazinho subiu com toda a prudência.
Os dois meninos deram então as mãos, abraçaram-se e riram. Depois, sentaram-se juntos na muralha, balançando as pernas.
Renate Welsh*

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